Almeida César diz na Assembleia Legislativa que já sabia de
distorções no fundo rotativo da Polícia Civil e da existência de “mordomóveis”
Michelotto (à
esquerda) e Almeida César (à direita)
durante reunião extraordinária na
Assembleia Legislativa
O secretário de Segurança Pública do Paraná, Reinaldo de Almeida
César, disse ontem que sabia da ocorrência de distorções na aplicação do fundo
rotativo da Polícia Civil (verba destinada à manutenção das delegacias) e da
existência dos “mordomóveis” (viaturas usadas por policiais para fins
pessoais). Classificando as irregularidades de problemas crônicos e históricos,
Almeida César negou que tenha havido má fé em ambos os casos e garantiu que o
governo do estado tomará providências para corrigir as falhas.
Intimidação
Deputado Tadeu Veneri pede que Sesp apure as ameaças contra
jornalistas
O presidente da comissão de direitos humanos da Assembleia
Legislativa do Paraná, deputado Tadeu Veneri (PT), disse em plenário que vai
pedir oficialmente à Secretária de Segurança Pública (Sesp) que “apure com
rigor” as ameaças recebidas por jornalistas da Gazeta do Povo, autores da série
“Polícia fora da lei”. O parlamentar pretende, ainda, convidar os jornalistas
para a próxima reunião do grupo especial. “É inaceitável que essas ameaças
tenham partido ou que possam partir de policiais, que são, antes de tudo,
servidores públicos. Isso é vergonhoso”, disse.
Na avaliação de Veneri, as irregularidades constatadas na
segurança pública do estado só vão se resolver com um “debate amplo, franco e
aberto”. “Ao invés de se ofenderem, os bons policiais deveriam aproveitar para
que essas práticas sejam extirpadas da instituição”, disse.
O líder do governo, Ademar Traiano (PSDB) entende que a Alep deva
se envolver minimamente na apuração das irregularidades e nas ameaças. Para
ele, é papel do Ministério Público se debruçar sobre as distorções apresentadas
pela Gazeta do Povo. “Não é nossa função investigar isso”, resumiu.
Verba não chega a 16 cidades pesquisadas
A Gazeta do Povo mostrou numa série de reportagens que 205 dos 399
municípios do Paraná não têm um único policial civil. Em muitas cidades, a
delegacia está abandonada há anos, ou simplesmente não existe, embora o
dinheiro para sua manutenção continue saindo do fundo rotativo da Polícia
Civil. Foram R$ 22,6 milhões nos últimos oito anos, uma média de R$ 2,8 milhões
anuais.
Durante cinco meses, quatro jornalistas da Gazeta do Povo
investigaram as contas da Polícia Civil, tiveram acesso a documentos secretos
obtidos de fontes de setores estratégicos, como o Grupo Auxiliar Financeiro, a
Divisão de Infraestrutura, da Corregedoria e da Secretaria de Segurança
Pública. Depois, percorreram 5 mil quilômetros em 16 cidades para comprovar o
desperdício de recursos que deveriam ser usados para manter as delegacias
abertas.
Em geral, os prédios que abrigam as delegacias foram repassados
pelo Estado à Polícia Civil, mas quem os ocupa é a Polícia Militar, que além do
trabalho de prevenção ao crime ainda tem de fazer investigações. Os militares
afirmam nunca ter visto o dinheiro destinado à manutenção dessas delegacias.
Nessas localidades, a prefeitura é determinante para garantir o funcionamento
da estrutura policial, financiando parte dos custos.
Em outra parte da série de reportagens, a Gazeta do Povo mostra
que integrantes da cúpula da Polícia Civil usam viaturas descaracterizadas para
fins particulares, como ir ao mercado, levar o filho à escola e até para ir ao
bordel. Para isso, obteve o inventário da frota da corporação junto à Subdivisão
de Transporte e Manutenção. Todas as informações foram catalogadas num banco de
dados e estão disponíveis para acesso público no site especial, clicando no
banner acima.
“Não vou permitir que a Polícia Civil e que a Polícia Militar
sejam enxovalhadas”, disse o secretário durante reunião extraordinária da
comissão de Segurança da Assembleia Legislativa. O encontro foi rápido. Vindos
de um compromisso oficial em Ponta Grossa, o secretário e o delegado-geral da
Polícia Civil, Marcus Vinícius Michelotto, ficaram diante dos deputados por
cerca de 20 minutos. Almeida César fez um curto pronunciamento e não
respondeu perguntas.
Michelotto teve tempo de responder a um questionamento: afirmou
que as verbas destinadas a delegacias sem policiais civis são aplicadas nas
delegacias regionais, de cidades que são sede de comarca ou de subdivisões.
“Desde setembro do ano passado, nós sabíamos e estávamos arrumando”, garantiu.
O delegado-geral disse que chegou a pensar em fechar definitivamente algumas
delegacias onde não existem policiais civis, mas não o fez por eventuais
problemas políticos.
Nenhum documento foi apresentado à comissão. O delegado Jairo
Estorilio, recém-nomeado chefe do Grupo Auxiliar Financeiro (GAF) da Polícia
Civil, assegurou que as notas e prestações de contas das delegacias existem e
estão arquivadas. Apesar disso, os documentos são manuscritos, o que pode
atrasar a apresentação às autoridades. O corregedor-geral da Polícia Civil,
Paulo Ernesto Araújo Cunha, foi também convocado, mas só chegou quando a
audiência havia terminado. Por isso, na próxima reunião, ele será convocado
para esclarecimentos.
Mais tempo
O pouco tempo de duração da reunião frustrou parlamentares que
integram a comissão, que não tiveram esclarecimentos consistentes sobre as
denúncias apresentadas pela Gazeta do Povo. “Não houve explicações, até por
causa do pouco tempo. Essa discussão não pode se dar em dois, três minutos,
como aconteceu aqui”, lamentou o deputado Tadeu Veneri (PT), que pretende ouvir
o secretário e o delegado-geral em outras reuniões da comissão.
O deputado Mauro Moraes (PSDB) afirmou que vai solicitar ao
secretário e ao delegado-geral documentos que comprovem a prestação de contas
das delegacias. Ele, no entanto, refutou a necessidade de instalação de
mecanismos mais abrangentes, como uma Comissão Especial de Investigação (CEI).
“Não é necessário. Para isso existe a comissão”, afirmou.
Comentando a admissão de falhas por parte da Sesp, o presidente do
Sindicato dos Investigadores de Polícia (Sipol), Roberto Ramires, disse esperar
medidas mais rápidas para resolver os problemas de segurança pública.
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