Criado em 2005, o Fundo de Recuperação das Calçadas ainda não foi
regulamentado; enquanto isso, pedestres encontram obstáculos em vários pontos
Morador do Cajuru, Anicesio de Souza diz que a região
sempre foi carente de calçadas.
Não há passeio nem no ponto de ônibus
Pensado para solucionar o problema das calçadas em Curitiba, o Fundo de
Recuperação das Calçadas (Funrecal) ainda não saiu do papel. O fundo foi
criado em 2005, junto com uma lei que disciplina a construção de calçadas na
cidade, mas, desde então, ele ainda não foi regulamentado. Segundo a
prefeitura, a lei que regulamenta o fundo ainda está em discussão entre as
secretarias do município, e não há previsão de ela ser enviada para votação na
Câmara Municipal.
Esse fundo poderia ser importante na melhoria da situação das calçadas
na capital. Hoje, muitas ruas da cidade sequer têm calçadas, enquanto outras
estão sob condições precárias. O Funrecal poderia servir para atrair,
canalizar e direcionar verbas para a melhoria de calçadas na cidade,
independentemente de outros projetos. Hoje, a maior parte da construção de
novos passeios apenas acompanha outras obras viárias, e está focado em vias
consideradas prioritárias. Com o fundo, as verbas poderiam ser direcionadas
para projetos exclusivos ao pedestre.
Dificuldade
Pedestre sofre com buracos e desníveis
Num simples trajeto de casa até o trabalho, por exemplo, é fácil
detectar uma calçada com defeitos ou até a falta de uma. Morador do Cajuru há
25 anos, o aposentado Anicesio de Souza afirma que a região sempre foi carente
de calçadas. As poucas que existem foram construídas pelos próprios moradores,
muitas de cimento bruto. Dono de um terreno de esquina, Anicesio conta que a
calçada em frente a sua casa foi ele mesmo quem fez, com a ajuda da esposa. “A
gente investe no que é da gente, para ficar bonito, limpo”, pondera o
aposentado.
Para ele, as calçadas são fundamentais e quando existem evitam que
as pessoas dividam espaço com os carros. A rua onde Anicesio mora é bastante
movimentada e ele sofre para andar de bicicleta. “Os moradores têm que
colaborar também, não dá para deixar tudo para a prefeitura”, diz.
Não é preciso ir muito longe do Centro da capital para se deparar
com alguma dificuldade provocada pelos buracos, desníveis e pedras soltas nas
calçadas. À beira de um trecho de difícil acesso para pedestres no bairro Água
Verde, a empregada doméstica Maria da Penha considera a situação vergonhosa
para uma cidade como Curitiba. “A gente ainda dá um jeitinho, mas e os
idosos?”, questiona. Ela prefere caminhar, o que faz quase todos os dias, a
usar o transporte coletivo, por medo de assaltos nos ônibus e estações-tubo. “É
perigoso no tubo, então é melhor andar a pé. Mas como com calçadas desse
jeito?.”
Para Ana Paula Carias, recepcionista de 37 anos, não se pode mais
usar salto alto, apenas sapatos baixos. “Não me atrevo mais porque já machuquei
o pé.” Já a dona de casa Jucilene Leandro Monteiro, de 41 anos, conta que na
Vila Lindóia, onde mora, as calçadas também são ruins. Ela diz já ter sofrido
muito para se locomover com o filho, de 7 anos, que precisou usar cadeira de
rodas após uma cirurgia no joelho, no ano passado.
Para o ex-diretor de Planejamento da Urbanização de Curitiba
(Urbs) João Carlos Cascaes, as implicações da falta de condições adequadas
nas calçadas são grandes o suficiente para influenciar até mesmo no aumento
do número de carros. “Todos os problemas da cidade caem sobre o pedestre:
insegurança, poluição, trânsito. O pedestre, por ter medo de andar na rua,
prefere o automóvel”, afirma.
Prioridades
Segundo a prefeitura de Curitiba, nos últimos três anos foram
investidos cerca de R$ 90 milhões na construção de calçadas, totalizando 361
quilômetros – na prática, elas cobrem apenas a metade disso, já que têm que ser
construídas em ambos os lados das ruas. Para 2012, estão previstos mais 95
quilômetros, que custarão R$ 23,7 milhões.
Os investimentos são feitos em áreas consideradas prioritárias
pela prefeitura, como vias estruturantes e localidades onde há um equipamento
público (um hospital, uma escola ou uma praça). Por concentrar mais imóveis e
maior circulação, esses locais podem ser vistos como mais importantes do que
outras ruas com menor tráfego de pedestres.
A maioria das ruas de Curitiba, entretanto, não se encaixa nesse
padrão. Nesses casos, a prefeitura conta com os proprietários dos imóveis
para realizar esse trabalho. No caso de reformas e novos empreendimentos, a
construção de calçadas é item obrigatório.
Responsabilidade
Legalmente, a responsabilidade por todas as calçadas da cidade são
dos proprietários, inclusive nas vias principais, e sua construção ou
revitalização deve seguir padrões estabelecidos pela prefeitura.
Para Cascaes, repassar aos proprietários a responsabilidade de
cuidar das calçadas não foi uma boa decisão. “A calçada tem que ser
responsabilidade do prefeito, e não do cidadão. O dono do terreno deve ser um
fiscal”, afirma.
Na avaliação dele, se a responsabilidade fosse toda da prefeitura,
seria mais fácil criar um grande projeto de construção de calçadas, talvez até
com financiamento externo. O Funrecal, nesse caso, serviria para canalizar
esses investimentos. “O banco não vai financiar cada proprietário, e sim a
prefeitura.”
Por Chico Marés
e Ellen Miecoanski

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