Mesmo que seja flagrado dirigindo bêbado, motorista que recusar o
bafômetro não poderá ser processado criminalmente

Com a decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que na última quarta-feira
restringiu as formas de comprovação de embriaguez ao volante, tribunais de todo
o país devem assistir a uma queda no número de ações penais motivadas pela Lei
Seca. Para juristas, a impossibilidade de contar com provas que não sejam o
teste do bafômetro e exame de sangue vai fazer com que muitos motoristas deixem
de ser processados, ainda que com sinais visíveis de embriaguez.
Pela decisão do STJ, relatos de testemunhas e testes em que o
médico examina o motorista visualmente não valem mais como prova para
incriminar alguém que dirige bêbado. Com isso, o condutor que se recusar a
fazer o bafômetro ou ceder amostra de sangue, mesmo com sinais de embriaguez,
não poderá ser incriminado e nem ficar preso. “A pessoa que quiser pode beber à
vontade e sair dirigindo. Se ela não quiser fazer o teste do bafômetro, não há
elementos para configurar uma ação penal. É o sepultamento definitivo da Lei
Seca”, avalia Maurício Januzzi, presidente da Comissão de Trânsito da seção
paulista da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Regulamentada em 2008, a Lei Seca estabeleceu para fins penais um grau
mínimo de seis decigramas de álcool por litro de sangue. Se o motorista se
recusasse a fazer o teste do bafômetro, respondia a uma ação na Justiça movida
pelo Ministério Público. No processo, testemunhos e exames médicos
“visuais” eram aceitos como prova, podendo o réu ser condenado a uma pena
máxima de três anos de prisão.
Somente na 1.ª Vara de Delitos de Trânsito de Curitiba foram
protocoladas mais de mil ações penais por embriaguez ao volante entre 2008,
quando a Lei Seca entrou em vigor, e 2011. Em 2009 foram 181 ações, contra 563
no ano passado, um incremento superior a 200%. Da mesma forma, as notificações
emitidas pelo Batalhão de Polícia de Trânsito de Curitiba (BPTran) vêm
crescendo significativamente, passando de 639 em 2008 para 1.540 em 2011.
Advogado criminalista e professor de Processo Penal da Pontifícia
Universidade Católica do Paraná (PUCPR), Adriano Bretas concorda que a decisão
do STJ vai implicar em uma quantidade cada vez menor de ações penais. “Se a
pessoa tiver 5,9 decigramas de álcool no sangue ela não cometeu crime. E
ninguém é obrigado a produzir provas contra si mesmo”, observa. Ele rechaça a
ideia de que a mudança pode aumentar a impunidade no trânsito. “Se um motorista
embriagado matar alguém, ele vai responder por homicídio, mesmo que não faça o
teste do bafômetro. Ele só não responderá pelo crime de embriaguez ao volante”,
esclarece.
A decisão do STJ tem impacto apenas do ponto de vista criminal. As
sanções administrativas, como perda da habilitação e multa, continuam a ser
aplicadas normalmente, mesmo nos casos de recusa do bafômetro.
Abaixo-assinado
Para tentar dar mais força à Lei Seca, a OAB de São Paulo elaborou uma
proposta a ser transformada em projeto de lei de iniciativa popular. A entidade
propõe que seja retirada do texto a limitação de dosagem alcoólica. “Nossa
proposta é estabelecer tolerância zero. Se não há limite mínimo, basta que um
médico comprove que o motorista está alcoolizado para ele ser enquadrado”,
explica Januzzi. Para que o projeto possa ser protocolado são necessárias 1,3
milhão de assinaturas. Até agora foram coletadas 300 mil. O documento está
disponível no site www.naofoiacidente.com.br.
Por Anderson Gonçalves
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