Vereadores que deveriam apurar irregularidades nos contratos de
publicidade da Casa tiveram relação com empresas e funcionários que receberam
verba de propaganda
Os vereadores responsáveis por investigar denúncias de irregularidades nos
contratos de publicidade da Câmara Municipal de Curitiba tiveram relação com
empresas ou funcionários que prestaram serviço de propaganda para a Casa.
Francisco Garcez (PSDB), que presidiu o processo contra o ex-presidente João
Cláudio Derosso (PSDB) no Conselho de Ética, era sócio de um jornal que recebeu
dinheiro da Câmara. Já um funcionário de Emerson Prado (PSDB), presidente da
Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), prestava serviços gráficos para o
Legislativo.
Tanto a CPI quanto a investigação no Conselho de Ética terminaram
sem responsabilizar os envolvidos (veja mais na cronologia). Apesar de
analisarem os mesmos documentos aos quais a reportagem da Gazeta do Povo e da
RPC TV teve acesso, vereadores afirmaram não ter encontrado indício de
irregularidades.
Durante três meses, a reportagem analisou documentos referentes a
menos de 10% dos quase R$ 34 milhões gastos pela Câmara para a execução do
contrato de publicidade. A documentação revela que o jornal de Garcez recebeu
pelo menos R$ 31,5 mil. Já a empresa que pertence a um ex-funcionário do
gabinete de Prado recebeu pelo menos R$ 3 mil.
Fora da lei
Além de levantar suspeitas sobre a independência e a lisura do
trabalho de apuração feito na Câmara, o fato de servidores públicos e até
vereadores terem recebido dinheiro do Legislativo é uma afronta à legislação. A
Lei de Licitações proíbe que funcionários da instituição pública que promove a
licitação participem, direta ou indiretamente, da execução do contrato o que
inclui também as subcontratações de serviços.
O esquema ilegal para direcionar dinheiro da Câmara para empresas ligadas
aos vereadores e funcionários foi possível através da licitação aberta por
Derosso para a contratação de agências a um custo anual de R$ 5,2 milhões.
Apenas as duas empresas vencedoras disputaram o certame: a Visão Publicidade,
antiga prestadora de serviço da Câmara, e a Oficina da Notícia, cuja dona é
Cláudia Queiroz – mulher de Derosso. Os contratos se estenderam por cinco anos.
Notas
Após ganhar a licitação, a Visão e a Oficina subcontrataram várias
empresas, entre elas a de Garcez e a do funcionário de Prado, para prestação de
serviço. Para conseguir receber pelo trabalho feito, a Folha do Boqueirão
emitiu ao menos nove notas fiscais nos anos de 2010 e 2011. As notas
apresentadas no ano passado revelam uma coincidência: num mesmo dia, 12 de abril,
a Folha do Boqueirão emitiu quatro notas em sequência, de R$ 3,5 mil cada.
Garcez disse à reportagem que se licenciou da sociedade do jornal
em 2009, quando assumiu o mandato. No entanto, a alteração contratual que
formaliza o desligamento do vereador da sociedade da Folha do Boqueirão só foi
registrada na Junta Comercial em setembro do ano passado dois meses depois
que o escândalo dos contratos de publicidade da Câmara veio à tona.
Gabinete
No caso de Emerson Prado, a empresa que recebeu dinheiro para
publicidade não pertence a ele, mas é de um comissionado que estava lotado no
gabinete dele na Câmara. A Donato Artes Gráficas está em nome de Gilson Donato
Coraiolla, que foi funcionário de Prado em dois períodos: de novembro de 2009 a
setembro de 2010 e de março de 2011 até fevereiro de 2012.
Embora Prado afirme desconhecer a atividade comercial de seu
funcionário (leia texto ao lado), é possível contratar serviços gráficos no
gabinete do vereador. Nilzete Bitencourt, ex-mulher de Gilson, é funcionária de
Prado desde 2009 e não evita falar de negócios dentro da Câmara.
A reportagem procurou Nilzete, dizendo que uma empresa precisava
de material gráfico. “Eu terceirizo [o trabalho de impressão]”, disse ela, sem
saber que estava sendo filmada. De dentro do gabinete, ela negociou um
orçamento. Nilzete afirmou que faria uma cotação de preços para a confecção de
cartões com várias gráficas e sugeriu que fosse enviado um e-mail com o pedido
para o endereço eletrônico dela no Legislativo. “Acho que tudo dá uns R$ 240.
Amanhã eu já passo o orçamento para você.”
Por Karlos Kohlbach,
Katia Brembatti, Gabriel Tabatcheik e James Alberti
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